O recente anúncio do governo federal sobre o reajuste salarial para servidores públicos reacendeu debates antigos sobre o equilíbrio fiscal e a sustentabilidade orçamentária do Brasil. A medida provisória (MP), desta terça-feira (31), formaliza uma série de acordos salariais que impactarão significativamente o orçamento público nos próximos anos.
Embora haja concordância que a valorização dos servidores é necessária para manter o setor público eficiente e moderno, os desafios econômicos do país exigem uma análise crítica da relação entre aumento de despesas e a busca por equilíbrio fiscal.
Os custos do reajuste e a realidade econômica
A proposta do governo inclui um reajuste em duas etapas, a primeira entra em vigor em janeiro de 2025 enquanto a segunda para em abril de 2026, além de prever a reestruturação de diversas carreiras no funcionalismo público. Estimativas mostram que o impacto nas contas públicas será de R$ 17,9 bilhões já em 2025 e de R$ 8,5 bilhões para 2026. Esses valores representam o maior aporte orçamentário para reajustes no Poder Executivo desde 2013. No entanto, para especialistas, o timing da medida levanta questões.
Não é novidade que o Brasil enfrenta desafios históricos relacionados ao déficit público e à necessidade de redução de despesas para equilibrar suas contas. Apesar das tentativas de contenção fiscal nos últimos anos, a realidade mostra que o país continua a lidar com uma dívida pública elevada pressionando o orçamento federal.
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Dessa forma, num cenário em que o aumento das receitas depende de uma recuperação econômica consistente, a criação do compromisso com reajustes salariais dessa magnitude pode limitar, e muito, a capacidade do governo de investir em áreas prioritárias, como infraestrutura, saúde e educação.
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A valorização necessária, mas o planejamento é essencial
É inegável que os servidores públicos desempenham um papel essencial na administração do país. Muitas carreiras, especialmente nas áreas de saúde, segurança pública e justiça, enfrentam defasagens salariais de longa data, o que afeta a motivação e compromete a capacidade de atrair novos talentos. É importante destacar, além disso, que o último reajuste linear, de 9%, ocorreu em 2023, após um período de 8 anos de estagnação salarial, ainda no governo Dilma Rousseff.
No entanto, qualquer medida de valorização dessa magnitude deve estar alinhada a um planejamento orçamentário rigoroso. A reestruturação das carreiras, prevista na MP, é um exemplo de avanço ao buscar maior eficiência no setor público, prolongando o tempo necessário para progressão ao topo das carreiras. Da mesma maneira, a transformação de cargos obsoletos em funções modernas também é um passo na direção certa, promovendo a adequação às demandas atuais. Ainda assim, o impacto fiscal dessas mudanças exige atenção, especialmente num momento em que o controle de gastos é peça chave para o resgate da credibilidade econômica do país.
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Projeções para 2025 e o caminho a seguir
À medida que 2024 chega ao fim, as discussões sobre o orçamento de 2025 tornam-se cada vez mais relevantes. O governo separou R$ 20,1 bilhões para os reajustes salariais, um montante significativo que, se mal administrado, pode sobrecarregar o orçamento federal. Assim, isso reforça a importância da adoção de uma abordagem equilibrada, que leve em conta tanto as necessidades dos servidores quanto a capacidade financeira do Estado.
Para que o Brasil possa avançar definitivamente rumo ao equilíbrio fiscal, será fundamental priorizar medidas que aumentem a eficiência no gasto público. Da mesma maneira, promover uma gestão mais transparente e responsável dos recursos disponíveis, mais que uma diretriz, é obrigação da atual gestão aos olhos dos céticos investidores.
Além disso, o país precisará criar um ambiente econômico favorável ao crescimento, com políticas que incentivem a produtividade e medidas que atraiam recursos externos. Sem essas ações complementares, o impacto dos reajustes pode se tornar um obstáculo adicional para a credibilidade das intenções governamentais e a estabilidade financeira no longo prazo.
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Conclusão
Desse modo, a valorização dos servidores públicos é um tema legítimo e necessário para garantir ao setor público eficiência e capacidade de atender às demandas da sociedade. No entanto, ela não pode ser dissociada da atual realidade econômica e fiscal do país. O anúncio dos reajustes salariais representa, ao governo, um enorme desafio de conciliar o aumento de despesas com a necessidade de um orçamento equilibrado.
Por fim, em 2025, o governo enfrentará a difícil tarefa de promover o crescimento econômico enquanto gerencia os impactos fiscais dessas medidas. O sucesso dependerá da capacidade de equilibrar a valorização do servidor, a eficiência administrativa e a responsabilidade fiscal, pavimentando o caminho para uma economia mais estável que atraia o interesse do capital externo.
Escrito por Mauro Motta, fundador do site Olhar Financeiro, editor do blog e especialista em planejamento e educação financeira pessoal, cujo objetivo é tornar o conhecimento financeiro acessível a todos.